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Read Ebook: Crónicas imorais by Sampaio Albino Forjaz De

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Ebook has 531 lines and 57129 words, and 11 pages

Release date: September 27, 2023

Original publication: Lisboa: Santos & Vieira, 1918

ALBINO FORJAZ DE SAMPAYO

<>

F. NIETZSCHE.

EDITORES--~SANTOS & VIEIRA~ EMPREZA LITTERARIA FLUMINENSE 125, RUA DOS RETROZEIROS, 125 LISBOA

CR?NICAS IMORAIS

OBRAS DO MESMO AUTOR:

PALAVRAS C?NICAS, 7.? milhar 1 volume LISBOA TR?GICA, 4.? milhar 1 >> PROSA VIL, 2.? milhar 1 >> GENTE DA RUA, 3.? milhar 1 >>

No prelo:

GRILHETAS 1 >>

ALBINO FORJAZ DE SAMPAYO

Cr?nicas imorais

<>.

F. NIETZSCHE.

DR. BRITO CAMACHO

Cr?nicas imorais

Os artigos, cr?nicas ou antes as impress?es que hoje se re?nem em volume s?o j? do dom?nio p?blico. Todavia devo declarar que n?o foi nele que pensei, quando as escrevi. Os quatro g?neros de criaturas que h? no mundo, <>, como quere Vieira, s? mediocremente me interessam. Publicam-se hoje porque isso me apraz, e se s?o m?s ou boas, tal n?o me far? doer a cabe?a. Nunca mais as lerei. S?o cousas que passaram, notas ? margem dum acontecimento, coment?rios a uma leitura, impress?es de momento, fumo, cinza, terra, nada. Viveram um dia. Hoje re?ne-as um certo egoismo. Vivi com elas. Acharia a algumas, se as voltasse a ler, uma ingenuidade primitiva; a outras uma piada estupenda. Pensadas e escritas ? hora em que o chefe da tipografia vem pedir original, s? para mim ter?o valor. No emtanto marcam cousas curiosas e s?o um depoimento pessoal n?o falho de inter?sse. Umas s?o indignadas, outras biliosas, algumas p?ndegas. N?o admira. Filhas do momento que as inspirou, devem tamb?m ter o seu gr?o de incoer?ncia, de petul?ncia, de atrevimento. Que importa? N?o as renego. Chamei-lhes imorais, porque algumas tiveram o cond?o de irritar muita gente boa, que ainda tem moral. Ah! abjecta gente a que ainda tem moral! Muitas mereceram acres censuras e outras ainda despertaram louvores. As que despertaram louvores tive o cuidado de n?o as juntar aqui. Devem ser m?s por f?r?a.

Vivendo a vida do jornal, perdendo-se no arquivo do esquecimento que o jornal ?, em pouco tempo estariam esquecidas. Em livro, n?o ser? mais longa a sua vida, mas sempre o ent?rro ? melhor engendrado. Imorais disse eu. Imorais sim porque qu?si sempre est?o em desac?rdo com a moral do meu parceiro. Que devo confessar-lhes, n?o me dou nada bem com os que est?o de ac?rdo. Quem est? de ac?rdo n?o sabe ter raz?o. Porque a raz?o n?o ? dos que a teem, ? dos que teem talento para a ter. Devo tamb?m confessar-lhes, que estas cr?nicas s?o inofensivas. A ningu?m fazem mal. N?o passam dum bom riso, um grande riso. Tolice seria tomar tudo isto a s?rio. O mundo ? uma esp?cie de revista e quem se mata morre cedo. Se alguma vez, leitor, te interessares, olha que tudo isto ? ilus?o. N?o vale a pena, em verdade te digo. Ilus?o, ilus?o s?mente. A como??o, a ironia, o riso, a tristeza, tudo isto que v?s reunido, tudo isto, n?o ? mais do que cousas que j? passaram, recorda??es, notas breves, leves apontamentos, terra, p?, nada, cinza.

E n?o se comovam que se acaba o pr?logo.

Ju?zo do ano

O ano que come?ou ontem ser? um ano igual aos outros. Igual, sem tirar nem p?r. Haver? nele, como j? houve o ano passado, como houve em todos os anos que passaram e como haver? em todos os anos que vierem, tolos que enriquecem e tolos que cavam p?s de burro, asnos que se suicidam e asnos que acham isto uma cousa ?ptima. Continuar? a haver uma ignor?ncia formid?vel da multid?o dominada e uma patifaria criminosa da minoria dominante; continuar? a haver homens cavalos e homens cavaleiros; s?bios que s?o burros e burros que s?o s?bios; muita maldade nas mulheres--a maldade nas mulheres ? um pleonasmo!--e muita estult?cia nos homens. Haver? c?res para todos os gostos, acepipes para todos os paladares e partidos para todos os cidad?os. N?o suceder? nada de novo, porque nada ? novo debaixo do sol, diz a voz grave do v?lho Eclesiastes, um m?gico que sabia muito mais da patifaria humana do que o snr. Civinini das mulheres que usam bigode e p?ra.

O novo ano ser? um ano feliz para quem jogar e lhe sair <>. Para os que joguem e lhes sair branco ser? um ano de azar.

Quem trabucar, manduca, a n?o ser que perca o apetite. Quanto ao resto, o que ?ste ano ser?, ? f?cil de adivinhar.

Para os tolos, uma felicidade, porque ?sses banab?ias s?o felizes todos os dias; para os que n?o sejam, nem eu mesmo sei.

Quanto ao ano art?stico, ser? deplor?vel, porque o que ter? menos ? arte, e de artistas nem sombra. Haver? v?rios quadros assinados por estes e aqueles fulanos. Se ? paisagem, j? sabemos o que ?: <>, <> ou a <>. Se ? retrato, um cavalheiro ou uma cavalheira de cara lambuza e desconfiada, olhos de goraz do vapor, ou ent?o um ar bonacho de quem diz ? gente: <>

Em arquitectura, continuar?o a aparecer projectos... do Pal?cio da Justi?a, de v?rias saladas de cal e areia para projecto ou para habitar, e de <>.

Os nossos escultores continuar?o fazendo Senhoras da Concei??o, cruzes para jazigos, e <> dum <> infinito.

O ano liter?rio... Continuar? a haver literatura, literatos vulgares de Linneu, literatos abezelgados e chu?s, porque, irm?os car?ssimos, <>. Homens de g?nio n?o haver?, mas em compensa??o abundosos se prognostica os homens de g?nio mau ou de bom g?nio, porque cada um ? como o pai o f?z. A cr?tica continuar? a ser como foi sempre: De mostarda, de manteiga, e de ?gua e sal.

E, tenho dito.

Quanto a ti, leitor molesto, eu n?o tiro o teu hor?scopo nem te leio as ruins ten??es de que porventura estejas cheio. Mas ? sempre bom conversar, uma conversa de amigos v?lhos e insepar?veis. N?o sei se ?s rico, se pobre, se alto, se baixo. Se rico, guarda a b?lsa que n?o preciso dela; se pobre, tem paci?ncia porque n?o te posso valer.

Dito isto, em verdade te digo que tens um ano diante de ti. Emprega-o bem. L? a vida do bom homem Ricardo, regula as tuas digest?es, n?o tenhas excessos e deita-te cedo. A isto se chama em bom portugu?s fazer pela vida.

Faze por ter dinheiro. O Dinheiro, al?m de ser tudo o que tu sabes, ? ainda aquilo com que se compram os mel?es. Se o tiveres n?o o emprestes nem o d?s. Se precisares n?o pe?as, porque ningu?m te vale. Gritar ? in?til tamb?m, para que n?o chames curiosos ? tua desventura.

Prefere <> e n?o te fies na Virgem. Porque se te fias na Virgem e n?o corres n?o tarda o fatal e bem merecido pontap?.

Se ?s casado n?o leves amigos a casa. Isto n?o ? para que te ofendas, ? por uma cousa que eu c? sei. Se tens filhos, ao menos um filho s?, que ? cousa que t?da a gente tem, seu ou alheio, faz do teu filho um homem forte. Bom est?mago, bons nervos, bons m?sculos. Antes o obrigues ? frequ?ncia do mestre Raku, um sujeito que ganha a vida a deitar os outros ao ch?o, do que ? de F?lix Pereira, que lhe ensina que meter os dedos no nariz ? porcaria. ? prefer?vel ser forte a ser bem-criado. ? mesmo prefer?vel ter f?r?a a ter direito, <>, ensina a experi?ncia dos homens e a sabedoria das na??es.

N?o continuo porque um cavalheiro que est? vendo o que eu escrevo, refila, em ar de resposta:

--<>

--<>--As mis?rias do pr?ximo comovem muito a caridade de cada um. E eu, que tamb?m me vou tornando az?do como o senhor Silva Pinto, resmunguei e recordei-me. Devia ser uma caridade como a daquele bar?o da Falperra que o nosso Alfredo Mesquita conheceu: Um homem t?o caridoso que, depois de ter ouvido um pobre contar-lhe as suas mis?rias, a ponto de o fazer chorar, chamava sempre o criado e, com a voz entrecortada de solu?os, ordenava:--<>

E para os que lhe dissessem que ?le lhe n?o dera nada, retorquia, que sim, que dera. Dera-lhe... aten??o.

E estava certo, como diz ainda o senhor Silva Pinto.

Artistas

Ser desconhecido em Portugal ? um caso banal?ssimo. Herculano, e ?sse Garrett que <> s?o, ainda que isto pare?a um paradoxo, qu?si desconhecidos. O grande p?blico n?o tem ideia d?les e ainda hoje uma das suas edi??es leva uma eternidade para se esgotar.

A indiferen?a do p?blico pelos artistas ? absoluta, e n?o vai longe ainda o tempo em que literato era sin?nimo de vadio. Camilo no P?rto, ao tempo, era s?mente um janota que para ali quebrava esquinas, um tal que n?o avezava com que mandar cantar um cego. Quando, pelos romances, ganhava com que forrar de cuidados o passadio de dois meses, n?o se imagina o esc?ndalo que aquilo produzia nos Ant?nios Jos?s da Silva e na rua das Congostas. O P?rto de ent?o tinha ideias seguras e via as cousas como devia ver. Literatos neste pa?s?! hum! e torcia o nariz como quem dizia que aquilo n?o era pr?tico, nem por aquele caminho se chegava a ter um rolosito de inscri??es, um pr?diosito, ou uma velhice sossegada. Era a vida pr?tica, o balc?o ? que era o caminho. Por isso, quando Camilo, j? no apogeu de gl?ria, em cartas duma dolorosa humildade, qu?si esmolava, para comer, a compra de pratas que os seus admiradores lhe ofereciam, o P?rto mui devia rir. ?le bem lhe dizia! N?o era aquele o caminho...

Em vida ningu?m o auxiliou, ningu?m o encorajou para prosseguir. Muito ao contr?rio perseguiam-no, sitiavam-no, roubavam-no, fechavam-lhe t?das as portas com intrigas soezes, com indr?minas de sabidos e ronha de marotos. Concurso a que f?sse, vaga a que concorresse, plano que tentasse viabilizar, certo era a mediocridade arranjista, por portas travessas, frustrar-lhe t?da a ambi??o e todo o Sonho.

Emquanto o homem viveu n?o puderam os amigos, ?sses amigos do diabo, atorment?-lo mais, nem mais o perseguirem. Depois de morto n?o houve lam?ria que n?o chorassem e n?o houve adjectivo sonoroso e amela?ado que a criatura n?o tivesse. A justi?a chega sempre depois da morte, ? certo, mas pela injusti?a dos vivos.

Alguns gazeteiros ou gazet?feros, com as palavras de louvor do clich?, justificam porque Augusto Santo n?o teve carruagem ?s horas, mesa lauta e colch?o f?fo. Foi, dizem ?les reprimendando os restos do escultor, porque era um inadaptado, porque desprezou sempre a arte de engorda, a que d? lucros e considera??es, e preferiu correr atr?s dum sonho que o exauria e que o matava, um sonho de arte irrealis?vel e irrealisado, arte verdadeira que n?o tem pre?o, embora ?s vezes se venda, e que n?o se compra, embora ?s vezes se adquira. E com um desd?m ol?mpico, absoluto, ditatorial, chamam-lhe... sonhador. Sonhador!... como se isto f?sse o sumo despr?zo ou a m?xima compaix?o. Deve ser bem triste morrer, assim!

Ao menos se essa turba se calasse e governasse vida, v?; mas vir babujar a sua irresponsabilidade desvergonhada no momento em que o pobre vencido solavancava a caminho do cemit?rio, ? intoler?vel. N?o se justifique, que ningu?m lhe tira o ganho: ela tem a sua utilidade. ?Quem ? que nos havia afinal de fazer os fretes?

Augusto Santo, n?o reste d?vida, foi um atormentado da forma. Quando a concep??o, megalomania conceptiva era nele, lhe fabulava maravilhas, logo o barro, parece que conluiado com os homens, debaixo dos gadanhos convulsos e nervosos tinha formas brutais, aduncas e agressivas. E a sua frialdade viscosa logo ali abafava o del?rio art?stico do pobre impotente e lhe dava crises de des?nimo capazes de vergar um atleta.

O Jettatore

?Mas n?o haver? olhares carregados de desconhecidos g?rmens morb?ficos, de elementos malfazejos, funestos e amea?adores?

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